lunes, 30 de abril de 2012

PRIMEIRO PASSO


 “Admitimos que éramos impotentes perante a nossa doença e que nossas vidas tinham se tornado incontroláveis”


Em primeiro lugar precisamos saber o que significa a nossa doença:
ADICÇÃO: Homem ou mulher que é escravo das drogas ou Álcool.
Nossa incapacidade de controlar o uso de drogas, Bebidas alcoólicas, alimentos, sexo, etc. Não somos impotentes somente perante as drogas ou álcool, mas também perante adicção.



Os resultados dessa doença são: Negação, substituição, desconfiança dos outros, culpa, justificação, vergonha, desleixo isolação e perda total do controle, degradação, estes são alguns dos resultados da doença.



Informações adicionais: O QUE NOS LEVA A USAR DROGAS?



Falta de harmonia no lar.
Falta de objetivos (pessoais profissionais etc.)
Falta de socialização.
Timidez e curiosidade.
Amizades com usuários.
Freqüentar ambientes propícios como, bares, boates,baladas etc. 
Falta de informação, consequências físicas, mentais, emocionais,sociais e espirituais.



Apresentação



Este trabalho tem como objetivo realizar uma leitura dos três primeiros passos do programa de 12 passos de Narcóticos Anônimos a partir de um raciocínio psicodinâmico. Esta proposta foi baseada no interesse de investigar o processo pelo qual o drogadicto se beneficia deste programa segundo uma coerência psicodinâmica, ou seja, transformando a linguagem original numa linguagem comum ao universo psicológico.



A leitura deste trabalho deverá ser iniciada a partir dos seguintes princípios:


1 - A análise realizada aqui considera que o drogadicto esteja entrando em contato com o programa pela primeira vez,

2 - Como a proposta do Programa de NA é manter este processo de recuperação por toda a vida, é sugerida uma leitura que corresponda á imagem de uma espiral, onde a cada recomeço do programa, novos recursos e mais eficientes vão sendo adquiridos, possibilitando, assim, um progressivo amadurecimento egóico.


Para uma melhor compreensão dos argumentos psicodinâmicos e da evolução de cada Passo, foram inseridas frases contidas no livro-base de Narcóticos Anônimos (1983) para ratificar e clarificar a idéia psicodinâmica que se expõe. Estas citações serão literais e serão identificadas pelas páginas no decorrer do texto. Inicia-se o estudo com a contextualização do quadro da drogadicção através da exposição de algumas característica peculiares a este fenômeno seguindo a exposição de cada um dos Passos propostos pelo Programa.



Introdução



O adicto possui uma debilidade egóica que o torna incapaz de suportar a depressão, tendo que recorrer a mecanismos maníacos para sua sobrevivência. No entanto, "a reação maníaca só pode ter êxito com a ajuda das drogas, porque para a produção da mania se requer certa fortaleza egóica" que o adicto não tem (ROSENFELD, 1978). A repetição deste movimento com conseqüência satisfatória (êxito), ou seja, a manutenção de um estado maníaco e anulação (temporária) da angústia, promove uma debilidade cada vez maior do ego, pois seu repertório de defesa contra a angustia e a depressão, que já era pobre, vai se tornando cada vez mais ineficiente quando comparado ao recurso defensivo externo (droga). Este maior empobrecimento ocorre pelo fato do recurso droga provocar alívio imediato, não exigir adiamento da gratificação, capacidade de espera e elaboração de soluções mais eficientes, ou seja, não possibilita que o ego faça uso de seus recursos mais sofisticados. O que é estimulado, portanto, é o uso de "mecanismos de defesa de baixo nível" em detrimento a "mecanismos de defesa de alto nível" descritos por Otto Kernberg (1976). Os últimos vão ficando cada vez mais escassos na economia psíquica, promovendo um funcionamento cada vez mais regredido. É acionado, portanto, um modo de funcionamento primitivo (processo primário), a linguagem (entendida a linguagem como o modo de expressão no mundo) utilizada é a do princípio do prazer que, com a sistematização e progressão dos episódios tóxicos vai se tornando característica de personalidade, modo de funcionamento imperante. O processo secundário de funcionamento vai se tornando cada vez mais difícil de ser resgatado.


Percebe-se, portanto, que este processo, é um processo de escolha narcísica, ou seja, a escolha dele por um "ele melhor". Exemplificando este argumento com a literatura de NA (1983): "A parte espiritual de nossa doença é o total egocentrismo" (pág. 22). É a escolha do ego (por identificação projetiva) pelo ego ideal numa tentativa mágica de incorporação do ego ideal através de um objeto ideal (droga). Toma a si mesmo, seu próprio corpo (ego ideal) como objeto de amor (FREUD, 1914). Não há relação de amor com objetos externos. O objeto externo é usado para um gozo narcísico. Vemos identidade com esta leitura na literatura de NA (1983) onde se diz: "Nossa doença nos isolava das pessoas, a não ser quando estávamos obtendo, usando e arranjando maneiras de obter mais" (pág. 4), ou seja, o outro (como no bebê), era visto como instrumento de uso para gratificação. A "relação" com o outro era um meio e não um fim em si mesma. (Poderíamos aqui, pensar o porquê desta regressão a um modo de funcionamento tão primitivo, recorrendo à teoria de relações de objeto em Melanie Klein (1945), onde, na relação com o outro o bebê se frustra e, mediante a incapacidade de lidar com esta frustração, regride a um funcionamento já conhecido onde a gratificação predominava. No entanto, refletir sobre a causalidade deste fenômeno nos distanciaria da proposta inicial. Deixemos, então estas reflexões para um outro momento).


Há, portanto, um progressivo desinvestimento libidinal dos objetos externos (família, trabalho, etc..) paralelo a um progressivo investimento libidinal no ego ideal (si mesmo alucinado). Este estado geral é parecido com o estado do bebê que, nos primeiros meses de vida reconhece a mãe como uma extensão de seu próprio corpo. A mãe é concebida como veículo de gratificação e alívio, ou seja, o self materno fortalece o self do bebê (WINNICOTT, 1964). Proporciona prazer e reduz o desprazer. Não é uma unidade diferenciada dele e, qualquer evidência do contrário é negada alucinatóriamente para não causar dor e sofrimento. Identificamos congruência com a literatura de NA (1983) quando é dito: "Alguns de nós começaram a ver os defeitos da adicção nas pessoas mais próximas. Dependíamos muito delas para nos arrastarem pela vida. Sentíamos raiva, frustração e dor quando elas encontravam outros interesses, amigos e pessoas queridas" (pág. 7). Esta situação é similar a do bebê. No entanto, este precisa ser "arrastado" por sua evidente ausência de recursos para sobreviver.

O drogadicto, apesar de possuir recursos físicos mais desenvolvidos que o bebê que poderiam promover certo grau de independência, possui recursos emocionais muito parecidos com os de um recém nascido. Estes recursos precários o paralisam e o tornam dependente da droga na mesma intensidade em que o bebê é dependente da mãe (que neste período também é objeto ideal). Podemos lembrar que qualquer psicopatologia que por ventura venha a se manifestar na vida não é estranha ao aparelho psíquico .Em algum momento do desenvolvimento psicossexual este funcionamento (hoje psicopatológico) foi considerado normal (FREUD, 1905; HEIMANN, 1982). Fica evidente, portanto, que existe um funcionamento com tendência à escravidão e à submissão que está ligado ao objeto ideal droga, mas poderia estar ligado a qualquer outro objeto como um dia esteve ligado ao objeto mãe sem ser considerado patológico. Na literatura de NA (1983) isso fica evidente da seguinte forma:

"Nossa incapacidade de controlar o uso de drogas é um sintoma da doença adicção. Não somos impotentes apenas perante as drogas, mas também perante a adicção". Aqui fica claro um reconhecimento deste funcionamento precário, com recursos precários.


O bebê ainda não consegue protelar quando sente dor, angustia e falta. Não tolera minimamente a espera. O bebê utiliza todos os recursos disponíveis para que esta idéia se sustente (conseguir gratificar-se a si próprio); por exemplo, quando está com fome e a gratificação não é imediata (demanda espera), o bebê, levando o dedo à boca alucina auto-suficiência (capacidade de satisfazer-se a si próprio), negando a dor (fome) e a realidade (necessidade de espera para gratificação eficiente e necessidade de ajuda na relação com o outro). Ele ainda não tem recursos egóicos para lidar com a dor e a realidade, assim como o drogadicto, que não tem recursos egóicos para lidar com sua dor e sua realidade, tendo também, que alucinar auto-suficiência. No entanto, esta alucinação só é adquirida e mantida através de um recurso externo (droga).
Porém, dependendo dos recursos egóicos de cada bebê e da economia pulsional inata, o princípio de realidade se impõe. Ele percebe que a dor (fome) não passa, apesar dos recursos utilizados (dedo na boca) e ele tem que admitir sua impotência em satisfazer-se onipotentemente.


Chegamos, então ao Primeiro Passo:


Primeiro Passo - "Admitimos que éramos impotentes perante a nossa adicção, que nossas vidas tinham se tornado incontroláveis".


A imposição do princípio de realidade gera um conflito, e, portanto, uma egodistonia . O que antes era egossintônico: ideal drogaditivo, através da imposição dolorosa da realidade, tornou-se egodistônico (KALINA, 1983). A solução dada até então para qualquer forma de angústia e de dor tornou-se ineficiente (O dedo na boca disfarça a fome apenas por um período). Devido a condições pulsionais inatas, para alguns, a realidade se impõe e para outros não (a impotência jamais será sentida se depender de recursos egóicos próprios, é necessário, nessas situações, uma intervenção externa - quando, por exemplo, a intervenção terapêutica adequada é uma internação compulsória). O tratamento só é eficiente quando está inserido um conflito, ou seja, uma quebra no ideal drogaditivo. Kalina9 explica este fenômeno da seguinte forma: "O adicto é um ser que pôs em funcionamento a parte psicótica da personalidade. Não responde à prova da realidade, nem à de experiência, não tem consciência da doença ou a tem parcialmente (ou melhor, dissociadamente) e vive de acordo com o delírio, que se converte, assim em sua própria ideologia de vida. Funciona egossintonicamente com seu delírio drogaditivo e, por isso, a internação, em regra geral, deveria ser a primeira medida a ser tomada para tentar sua reabilitação, pois necessitamos criar-lhe um conflito, uma egodistonia" (KALINA, 1983). No entanto, se considerarmos as diferenças pessoais de um modo geral e dos drogaditos em particular, percebemos que, por condições pulsionais inatas ou por recursos egóicos adquiridos (fixação libidinal em estágios mais avançados do desenvolvimento psicossexual), alguns reconhecem a realidade e a sua impotência sem necessitar de intervenções como a internação compulsória, ou seja, o conflito é instalado por recursos próprios. O programa de NA, portanto, só é capaz de beneficiar indivíduos que possuem recursos suficientes para reconhecer a realidade externa.


Na literatura de NA (1983), identificamos a idéia de conflito da seguinte forma: "Quando dizemos não temos escolha (inexistência de conflito, apenas um caminho a seguir), mostramos a incapacidade de parar de usar (...). No entanto, nós temos uma escolha (conflito instalado, mais de um caminho a seguir) quando paramos de tentar justificar nosso uso" (pag. 21).

Lembramos, portanto, que o programa de NA propõe a aquisição de recursos egóicos mais sofisticados e elaborados que vão sendo adquiridos sistematicamente. A proposta (Primeiro Passo) exige um compromisso definitivo com a realidade e com o processo secundário de funcionamento: "Nenhum dos passos trabalha por mágica" (NARCOTICOS ANÔNIMOS, 1983, pág. 24). Este pode ser considerado o mais importante dos passos por inserir este compromisso com a realidade externa. Nosso objetivo aqui é fazer uma leitura psicodinâmica deste processo. A posição esquizo-paranóide, antes predominante, dá lugar a uma posição depressiva, ou seja, o delírio de amor narcísico sustentado pela droga, dá lugar a uma ansiedade depressiva (confluência de amor e ódio pelo mesmo objeto - si mesmo) que é expresso pela forma de culpa mais arcaica e angustiada devido a sentimentos ambivalentes para com um objeto (KLEIN, 1982). "Ao nos sentirmos derrotados ficamos prontos" (NARCÓTICOS ANÔNIMOS, 1983, pág. 21). Apesar de sentir-se fracassado, está vivo e pretende manter-se assim (predomínio do instinto de vida). Para que o drogadicto suporte este acumulo de angústia, é necessário que tenha alguma estrutura egóica adquirida durante seu desenvolvimento. O bebê, em certo estágio do desenvolvimento, já se acha física e emocionalmente maduro para integrar suas percepções fragmentadas da mãe, reunindo as versões (imagos) boas e más.


No entanto, neste Primeiro Passo, o adicto ainda está num estágio anterior. Ainda está integrando sua própria imagem, suportando sua ambivalência em relação a si próprio, ainda não considera a existência de um outro. Está se reconhecendo progressivamente um bebê vulnerável e desprotegido e, "até abrir mão de todas as restrições, estará colocando em risco os alicerces de sua recuperação" (NARCÓTICOS ANÔNIMOS, 1983, pág. 22). 

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